APRENDENDO COM BOCAGE!!!

Quando se fala em Bocage, a maioria das pessoas torce o nariz, pois como todos sabem ele foi um incorrigível pecador. Isso é verdade é claro, mas poucos sabem que ele, no final da vida, compôs poesias de arrependimento, retratando-se do estilo de vida e das composições anteriores

Manuel Maria de Barbosa Du Bocage foi o mais renomado poeta português do século XVIII. Notabilizou-se como poeta Erótico e pornográfico e de imaginação brilhante, o que ligou seu nome a episódios que enchem o anedotário popular de muitas histórias sobre ele.  Segundo a crítica, levou uma vida devassa, como a retratada na sua poesia.
Como poeta satírico ataca em suas poesias, ora em termos mais elevados, ora em termos bem vulgares, a sociedade em geral, as instituições e todo tipo de hipocrisia moral. Por isso recebeu a alcunha de “O Poeta Maldito”
Contudo, quando se aproxima seu fim, ele, numa atitude introspectiva, faz a síntese da sua vida, admitindo que o pecado, a devassidão, a preocupação com o dia a dia, não passam de ilusões terrenas.  Reconhece finalmente que o ´carpe diem`, ou seja, aproveitar a vida, não passa de loucura humana.  Nisso ele está de acordo com a palavra de Deus que diz: Quem ama a sua vida, perdê-la-á...Jo 12.25a.”
Vamos, nos versos abaixo, procurar ver nas entrelinhas o que Bocage revela sobre o que escreveu e viveu:                                                                                          
           
MEU SER EVAPOREI NA LIDA INSANA                     COMENTÁRIO            

Meu ser evaporei na lida insana
Do tropel de paixões, que me arrastava;
Ah! cego eu cria, ah! mísero eu sonhava
Em mim quase imortal a essência humana.

Na primeira estrofe o poeta admite que gastou a vida nos afazeres do dia a dia, e que  isso é uma loucura (insana). Para ele, as paixões humanas o cegaram a ponto de, ele um pobre coitado (mísero), acreditar que era imortal.
 Tristemente, muitos levam a vida assim, julgam que não vão morrer nunca e que o importante é ser feliz, sem pensar no amanhã.

De que inúmeros sóis a mente ufana
Existência falaz me não dourava!
Mas eis sucumbe a Natureza escrava
Ao mal, que a vida em sua orgia dana.

Na segunda estrofe, constata que os ´inúmeros sois`, ou seja, as  ilusões mundanas são arrogância e presunção da mente (ufana). Esses sois não passavam de ardis e não douravam sua existência, nem iluminavam seu caminho.
De fato, as ilusões desta vida são o que são, apenas ilusões.

Prazeres, sócios meus, e meus tiranos!
Esta alma, que sedenta em si não coube,
No abismo vos sumiu dos desenganos.


Na terceira estrofe diz que os prazeres são seus sócios, sedentos (insaciáveis) e, com isso tornam-se seus tiranos, pois sempre exigem mais.
Satanás domina, mas Jesus liberta!

Deus, oh Deus!... Quando a morte à luz me roube,
Ganhe um momento o que perderam anos,
Saiba morrer o que viver não soube.

Na última estrofe, o poeta usa uma fala de arrependimento. Pede a Deus que, na hora de sua morte, possa ser perdoado por não ter tido uma vida digna.
CONCLUSÃO:

Podemos fazer uma reflexão sobre a vida e obra de Bocage e tirar alguns exemplos para nossas vidas. Afinal temos diante de nós o depoimento em versos de um homem eminente, que passou de pecador a arrependido, reconhecendo que estava errado em sua postura na vida.

Primeiramente vale destacar que ele deixou bem claro no poema acima que viver a vida com uma visão voltada para as atividades e os prazeres terrenos são loucura, cegueira e ilusão. Concluímos, pelo que ele disse, que devemos olhar menos para a terra – que jaz no maligno - e mais para o céu, para Deus.

Em seguida, não podemos deixar de destacar a coragem do poeta em reconhecer publicamente que o que escreveu e viveu eram uma mentira, que o que importa é Deus. Ele usa a poesia, ou seja, o mesmo meio de comunicação que o celebrizou como devasso, para se retratar. A poesia poderia ser considerada na época, a mídia de hoje. Isso é um exemplo para aqueles que ofendem seu próximo ou a Deus em público e com estardalhaço e depois pedem perdão, quando pedem, no particular, baixinho. Será que há realmente arrependimento?
A atitude de humildade de Bocage em reconhecer abertamente que agia errado, pode ser considerada como se um político assumisse a tribuna da câmara ou do senado e admitisse que era ladrão e corrupto e pedisse perdão.

 Em outro poema em que também faz a sua ´mea culpa`, ou seja, em que confessa e reconhece os próprios erros, ele chega a pedir que rasguem seus escritos, passem uma borracha em tudo que disse e viveu, ou seja, seu sucesso não era nada diante da eternidade:

                                               Eu aos Céus ultrajei! O meu tormento
                                               Leve me torne sempre a terra dura.
                                               ...........................................................
                                               Outro Aretino fui... a santidade
                                               Manchei!...Oh! Se me creste, gente ímpia,
                                               Rasga meus versos, crê na eternidade


Finalmente, uma advertência é que não sabemos o futuro, como será nosso fim. Se será repentino e não teremos tempo de no retratar como o poeta e pedir perdão a Deus.  Cuidado, se pensa em aproveitar a vida e deixar Deus para depois. Não sabemos o amanhã.

Que Deus nos ajude para termos coragem de assumir nossos erros e abandoná-los o mais rápido possível!
Amém!

Lúcio Barreto (pai) - Pr e Bacharel em Letras